O PÁSSARO E O NADA

(ando pela cidade)

O pássaro canta

Na cidade ensolarada.

A cidade é grande

E não se ouve nada.

 

O passado canta

Na cidade abandonada.

Dentro de mim há o meu tormento

E minha tragédia está armada.

 

Aqui nesse meu lugar tudo se transforma.

Não se perde o pássaro, nem a cidade.

O nada se agrega ao nada e toma forma.

Forma do meu caminho, forma da minha perdição.

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AMPULHETA

Abro a porta

E agora a desesperança

Desfez o tempo num areal.

 

Junto a mim

Você afunda na areia

Branca amarelada brilhante, a areia.

 

Mãos dadas.

Calor, dor, amor.

Não sei onde estou,

 

Mas estou com você.

Longe, com você.

Perto, com você.

 

Branca amarelada brilhante,

E os teus cabelos negros,

E os teus olhos negros.

 

E a areia está lá,

Farelos do nosso corpo e alma,

Descendo na ampulheta.

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Ato III – Poeta mantém estável solilóquio entre os carros

Quando te construíram, homem,

Eu estava lá.

Vi que emergiste junto com o amor, como o amor,

Pelo amor, para o amor.

Dos cantos lúgubres, de algum sonho proibido,

Quase imperceptível, mas senhor de si.

 

E hoje, para o que olho?

Fragmentos, memórias, pudor?

Tu refazes diariamente seu meio,

Moldas todos ao seu redor,

Sentes vontades de qualquer forma de liberdade,

E ainda não sabes qual é a sua prisão.

Ela, pois, é o mais lúcido dos anjos,

O mais nobre dos sorrisos,

E a única razão de tua vida:

A imensidão perene de morrer.

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Tu Que Ostentas O Mundo (Elegia Brasil)

I- Mundo Vasto Mundo e Todos os Raimundos

Corpos fechados não  veem a indivisível paixão que guarda o mundo

de seus homens.

Hominis em constante comodato

mantém contrato pétreo com a insensibilidade

e o egoísmo

e o que sentes

tudo o que sentes,

e não divides

o homem, mas sente.

Teu coração não guarda mais espaço

e ostenta amadas e sonhos

e uma utópica paz que não se vê nas bocas alheias,

teu coração é só sonho,

que bate acordado,

mas não existe nos desejos por tudo e tanto desejar.

É tudo mais e mais parecido com a ansia de amar.

Continua concavo as cognições

e perdido em brumas televisivas

-chora novelas!

não vê crescer

os filhos que fazem diminuir a terra que amou um dia,

nos sentidos mais distintos, são do mesmo corpo

corpos distintos.

 

II- Fome , Sede e Amor.

Anseias a ceia

de além,

mas Jesus vive entre vocês

e as criadas

entre a terra

e (incrivelmente) até tu.

Conta os prórpios passos.

Conta os filhos.

E não acha mais caminhos entre pedras,

marujo…

fechando janelas

e construíndo mais casas

e fechando as janelas novas

das casas novas,

assim não deixa entrar a velha dor e solidão.

Teus ombros ainda suportam a dor de teus irmão?

Sem filhos

sem auto

sem mulher

sem ao menos uma fermentada

fuma sem tragar

o pulmão do mundo

nos seios qeu não te pertencem

por mais que vinte minutos.

 

III- E tu Brasil?

E tu,

transcendente ao azul plácido das cortinas,

vai com sede,

e não passa dos panos que o maltrapeiam

tu resguarda o mundo

que não passa mais fome

que não quer liberdade

nem igualdade

nem fraternidade,

talvez um bom plano que saúde.

(ora, que bobagem, onde se acha isso?)

Abre

fundo o peito

e morre com a pouca brisa

Que o Leblon, a Tijuca lhe oferece,

ri alto

canta com amigos

mande os filhos para Europa.

e ame tua mulher (todas elas)

Deus abençõe o Brasil que é do homem-

de todos

é que ostentas o amor

as revistas,

rostos, capas, novelas

mortes

entorpecentes e entorpecidos

fartura

a partida de quarta

a de domingo

as peladas

e as nuas

e o mundo.

 

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Poesia dedicada à uma amiga minha  que disse gostar demais dessa aí…nem eu gosto, particularmente sou intimista e não “poeta” social, isso eu deixo pro Vitux…todocaso, ta aí, o Max social, a leitura pode assustar pois não se parece com oque já postei aqui, mas espero que gostem…mais que eu.

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Arquivado em Max

AS MÃOS

 

Uma mão na mesa,

mão solta e travessa

que afaga a cabeça

da criança interior.

 

(Sofrimento interno, coração cheio de fulgor)

 

O que fazer com a mão?

No bolso, no nariz,

ou em órgão de rubra matriz?

 

Coceira, coceira, coceira,

coço a cabeça com a mão,

mas descubro o mundo na cabeceira.

Intocável é o mundo, longe da mão.

 

O tato nada mais é

do que inevitável maré:

sensação efêmera

dos que vem e que vão.

 

(Barulho de ondas, ouça: “Hoje beija, amanhã não”)

 

A dor vem na sensação,

sensação de falta ou cheia,

como rios perenes que são.

 

A mão na água

me dá uma sensação:

a sensação afoga

e o mundo está lá para

pesar em meu corpo.

Minha mão é simples perceptora

da sensação absoluta

do fluxo de tocar.

 

Brusco tormento, agitar de ondas,

ondas que minhas mãos já não sentem.

Eu amaldiçoo o momento

em que minhas mãos

não servem para nada mais.

 

Não se acariciam, as mãos,

elas querem, mas não se tocam.

Desconhecido, incontrolável, tesão,

paixão, amor, dói como o cão

 

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Arquivado em Caio

Selvageria Compilada.

Mais vale um dólar no banco que dois na mão.

.

Trouxe na minha trouxa

os ares da cidade grande

e os mares do interior.

.

A ordem das rosas

não altera o buquê.

.

Não só de sílabas poéticas vive a poesia.

.

Verei se tiro um tempo

para regar minhas flores de plástico.

.

Não a morte, mas a vida se encarregou de nos separar.

.

Ó mar,

quem tu pensas que engana

com esses olhos de ressaca

e essa boca de maresia?

.

A menina se enforcou

em fitinhas do Senhor do Bonfim.

.

A vida é o gosto na boca

de um café que se tomou ontem.

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Arquivado em Beatriz

Ato II: Poeta tenta contactar homem e é impedido pelo tráfego

Em nada inspira-me uma cidade.

Em tudo a cidade é inspirada:

Cresce, arranha o céu,

Endurece, arranha o homem.

 

Vejo-te deslocado em si,

Tentas humanizar o que tocas,

Nada compensará.

Deus não atravessará a rua.

O amor não nascerá na calçada.

Nenhum auto te entenderá.

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Arquivado em Augusto de Sá

Ato I: Poeta encontra homem perdido em si

Abraçou-me uma escuridão.

O ar da cidade pesa toneladas,

A alma do ser paira n’algum lugar,

Uma sinalização luminosa não conduz a canto algum:

Já é um templo em si.

 

Não me comove o sepultamento coletivo,

Dá aval ao avanço do trem, do carro, do avião.

Um céu chora burocraticamente.

Um solo não tem por que absolver.

Um homem não tem pelo que morrer.

 

Nunca teremos uma parte desse infindável latifúndio.

Inexistimos, homem.

E ao mesmo tempo brilhamos

(na avenida, na gasolina, na margarina).

 

Somos fragmentados, homem.

Perco minha batalha para ganhares a sua.

Vivemos por alguns dias, moldaram-nos em puro ouro,

Fomos adquirido e hoje somos bibelô.

Estamos impassíveis, homem.

Imersos em sorte,

Inertes,

Fundamentados e refundamentados.

 

Tudo está na mais perfeita ordem.

A vida é bela em letras garrafais.

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GIRANDO EM VOLTA DA MESA

Existe como vento sem direção, sem sentido,

O passado e o futuro não entram em questão.

Não há ida, não há volta, nem o lugar…

Nem há silêncio sem leve suspiro de prazer.

 

O tornado gira em volta da mesa,

Não há direção, não há futuro em questão.

Na ida não há volta, porque o que foi prazer

Não voltará a ser silêncio.

 

A poesia de amar em mim se esboçou,

E não preciso saber falar, ler, escrever,

Para sentir sua caligrafia misteriosa

Preencher minhas páginas levadas pelo vento.

 

O vento gira como tornado em volta da mesa.

Não há silêncio no passado ou sentido no futuro.

O que falou está falado e agora temos é que

Girar em volta do mundo.

 

A translação de amar, que reinventa o amor

Em volta da mesa do passado. Amar,

Sem saber esboçar a caligrafia do futuro,

E preencher a tudo com o amor do mundo.

 

Não há silêncio para escrever,

O que sobra é falar e girar

Em volta do que não tem sentido.

Mais do que passado, o presente é amar.

 

Concretizo o verbo de girar,

Esboço o futuro de fazer amar,

Só amar agora em volta da mesa:

Amar como tornado sem direção.

 

Ser a direção do vento,

O tornado da poesia de girar, escrever, ler

E falar sobre os mistérios de amar em volta da mesa.

Não há espaço para o sentido do prazer.

 

Improvisar, sem tempo de girar,

Na direção do futuro sem questão.

Suspirar o prazer do mundo e fazer vento,

Escrever a caligrafia do amor-momento.

 

Existir como o choro de amar e crer.

Girar como o finado momento de saber.

Não há volta sem a ida

E não há amor sem passado.

 

Não importa o passado de amar,

Nem há sentido no futuro para escrever.

Giro o tornado negro de falar

E logo retorno ao meu silêncio de não crer.

 

Na negritude de seus olhos contemplo

O Mistério de falar, escrever, amar e compreender.

O tornado que gira é nosso amor

E para esse amor gira o vento ao morrer.

 

Amor,

Na saúde de amar,

Na doença de adorar,

Na riqueza de girar,

Na pobreza de olvidar,

Esperar que o amor

Nos separe da morte

De sofrer.

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Verde é a Cor.

Piscou o olho verde e eu sorri.

De resto, era tudo de um cinza amargo:

A fumaça que saía de sua boca, a minha camisa surrada, o asfalto ainda quente do sol de outrora, o céu da tempestade, a tristeza de nossas vidas.

 

Mas aquele verde, aquele pedaço de cor…

Parecia ser suficiente para colorir minh’alma

Para tornar vermelho o sangue

Para pintar de azul o céu

Para fazer bater no peito o coração morto.

 

Quisera encapar de verde o mundo

Quisera vestir a cor de uma vida

Quisera sentir o gosto de uma cor

Quisera mais que esmero,

os olhos de esmeraldas.

 

 

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Cá estou, Beatriz: a pouca vergonha das saias e o amar de Platão. Inteira feita em prosa, venho pintar de vida o quadro monocromático deste recinto. De quando em quando, darei o ar da graça, mas, desde já, saliento: Tabacaria é dos meus poetas e dos meus poetas somente. Sou apenas um transeunte, um fantasma. A sombra de minhas mãos, porém, se fará eventualmente presente para vos puxar os pés e acariciar a face.
Para bem ou para mal: prometo manter contato.

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